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A turba dos burgessos

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Ontem houve futebol.
O país, depois de duas horas suspenso nos écrans das televisões, festeja os golos de Cristiano Ronaldo.
Portugal apurou-se, dizem, e os sorrisos e as conversas dão tréguas à amaldiçoada crise.
Os portugueses ganham, por frágeis momentos, a ilusão de um Brasil tropical onde apenas alguns poderão ir ver o futebol e onde, outros milhares, sonham com o trabalho e o emprego que o seu país lhes nega.
À hora marcada, no inicio do jogo, cantam – se os hinos. O nacional Português, com alguns dos jogadores de boca cerrada, teve ontem para mim um sabor amargo.
Calaram a voz da Vera.
A Vera Guita é uma jovem professora portuguesa emigrada na Suécia há dois anos.
Entre outros atributos a Vera é cantora e uma das mais belas vozes que tem dado ao Coral de São Domingos, de Montemor-o-Novo, prestigio e o reconhecimento aquém e além-fronteiras.
A Vera foi convidada pela Federação de Futebol Sueca para cantar o Hino Nacional Português.
Já no estádio, pronta para ensaiar com a sua magnífica voz, que decerto iria encantar milhões pelo mundo, um grupo de grunhos dirigentes da federação portuguesa não aceitou a sugestão que era uma gentileza e cortesia da Suécia para com Portugal.
A Vera foi impedida de cantar o seu Hino.
Um grupo de gente que vive do dinheiro dos nossos impostos, impediu uma jovem portuguesa emigrada de fazer aquilo de que mais gosta – cantar.
Cantar dali, daquele palco da vida, para todos os portugueses no mundo.
Ontem esta gentalha de dirigentes do futebol matou mais um sonho desta jovem e prestou um péssimo serviço ao país.
Ontem pensei em toda uma geração de jovens portugueses, nos filhos dos amigos e nos familiares de todos, um pouco espalhados por todo o mundo, que deixaram Portugal para trabalhar.
Há mais de vinte anos a Vera Guita foi minha aluna.
Ontem senti que não podemos calar a voz de ninguém em nome de uma turba de burgessos que vivem na sombra do sonho, do trabalho e do sofrimento dos outros.
Ontem estes “senhores” fizeram-me sentir que Portugal é, ainda, um país adiado.
Continuação de Boa semana

Silvino Barata Alhinho (crónica na rádio diana)

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