A maldição que se abateu sobre o Centro Histórico (CH) não tem autor, feiticeiro ou demónio, conhecido. Mas tem-se revelado impossível esconjurá-la, embora nos programas eleitorais dos sucessivos candidatos às eleições e na acção dos sucessivos poderes tenha sempre figurado em lugar de destaque: reabilitar o CH, revitalizá-lo atraindo habitantes, etc. Com as eleições à porta, as declarações de intenção em relação ao CH voltam à boca da cena. Todas elas têm desta vez uma dificuldade acrescida, dada a situação financeira desastrosa da CME, o contexto nacional (descalabro precipitado pela crise financeira e agravado por políticas de austeridade capazes de matar países bem mais sólidos que Portugal), europeu (aprofundamento da ruptura entre Europa do Norte e Europa do Sul), mundial (nível ao qual a crise financeira está muito longe de se resolver).
A maldição denuncia-se nos seus efeitos: a partir do fim dos anos 1950 e até ao presente a população intramuros não parou de decrescer. Em números redondos, ela foi dividida por um factor próximo de cinco (de quase 20.000 para cerca de 4500 pessoas na actualidade). Os programas eleitorais que se sucederam após o derrube da ditadura salazarista vincaram a vontade de suster esse movimento e até de invertê-lo. Os resultados foram nulos. Pelo contrário, na curva descendente da população intramuros surge um momento em que a descida se acentua: a partir dos anos 1986 e seguintes. O que explica esse facto são dois acontecimentos que tornam esse ano um marco importante: a inscrição pela UNESCO do CH de Évora na lista do Património da Humanidade e a entrada do país na CEE. O primeiro, tendo um óbvio impacto local, introduziu uma armadura regulamentar que, apoiando-se parte numa tradição restritiva já existente, veio limitar ainda mais a liberdade de acção das pessoas e a sua capacidade para intervirem no seu quadro de vida. O segundo, ao abrir as portas do crédito, ao disponibilizar fundos a custo zero (ou quase) para investimento público, favoreceu sobretudo a construção do novo, infra-estruturas e habitação, o que aparentemente só se podia fazer fora das muralhas. Que mecanismos explicam esse processo de abandono?
José Rodrigues dos Santos / Junho de 2013 (via email)