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Channel: A Cinco Tons
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Há tanto tempo que o cante é património da humanidade!... (mas parece que há alguns que não sabem...)

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A Saída dos Homens do Cante

O convite chegou por telefone. Uma conversa simples. Em poucas palavras se disse o necessário. 
O dia, a hora. Sim, haveria um desfile, coisa curta. E atuação em palco. Três modas e a de despedida. 
E transporte? Perguntava a voz do lado de lá, na fala de um alentejano que deixou o Alentejo. Façam uma carta ou mandem por email que a gente pede o autocarro.
Faltavam três meses e três dias para o encontro. Os homens do grupo convidado ficaram a saber no ensaio, não no da semana do convite que esse foi desmarcado. Tinha morrido um familiar. Foi na terça-feira a seguir. 
Formem lá. Antes de começarmos temos aqui informação. Recebemos um convite. 
Há condições para irmos?
Então não havemos de ir porquê?! 
Então isso mete desfile? 
Mete. 
Acho que são 7 grupos, dizia o homem que tinha recebido a chamada. O homem que organiza o grupo. O homem que quase lê os pensamentos dos outros homens que formam diante de si. Na sala de ensaio. Que vê os seus rostos e os seus trejeitos. O homem que tem de aguentar mais que os outros. Porque o cante dá trabalho, dá moengas. Tem de haver alguém que tenha jeito e paciência.
O tempo passou porque o tempo não para.
Quem é que não pode ir? Há alguém que não vai? Acompanhantes? Duas? Não há problema. Já sabem. Sábado, à hora combinada!
Partiram. 12h30. Abalaram para a margem sul. Desta vez não passavam a ponte. Cafézinho tomado. Um jornalinho para ler, A Bola. A malta nova ainda meio ensonada. Os velhos fartos de estar já acordados. Primeira paragem. Alcácer do Sal. A estação onde se fuma e outras coisas se fazem porque o corpo e o organismo assim o pedem. 
Pouco tempo, não se vá chegar atrasado. Sim, homem! 
No rádio tocavam músicas seguidas, dizia a voz da rádio. 
Saíram da autoestrada.
Chega lá mais perto o autocarro? Não chega! Chega! Há aqui um homem que não pode andar. Chegou. 
Teve de se desviar um contentor do lixo. Desceram-se dois homens ainda sem chapéu na cabeça. Encosta mais à esquerda! Passa, passa.
Passou. Mais 300 metros a pé. Já se viam as mulheres de um coral, de malas ao ombro. 
Porra que chegamos sempre atrasados! Lá estás tu! 
30 minutos depois começou o desfile. Já tinha sido entregue a ordem dos grupos. Já os homens tinham bebido minis, copos de vinho, uns de branco, outros de tinto. Já se tinham cumprimentado alentejanos e alentejanas. Tantos familiares, alguns afastados outros chegados. Netos e netas, moços e moças de uma outra geração, que já não nasceram em Beja, ou em Évora, nasceram ali naquelas bandas. Nas cidades de tanta gente.
Nas ruas, os passeios eram plateias. Às janelas dos andares mais baixos, algumas mulheres viam os alentejanos da sua rua a apreciar o cante. 
Mais ao fundo, esvoaçava a bandeira da sede da associação recreativa e desportiva. Ao lado, um palco com cobertura para o sol, ou para a chuva. O som propagava-se bem. A voz era forte combinando bem com o rosto largo e um bigode farfalhudo do homem que apresentava o encontro. Tinham tantos microfones. Assim, sim. Por ali foram passando os seis grupos. Um tinha faltado. Ali se interpretaram as modas escolhidas nos ensaios. Repetiram-se algumas. 
Alentejo, Alentejo foi cantada duas vezes. Tão e que tem lá que se cante, cada um canta de maneira diferente! 
O cozido de grãos tinha sido bom, no ano passado. Desta vez tinha sido carne de porco à alentejana. Comeram bem. O vinho, bem, uns gostaram outros não, mas todos beberam bem. Um cafezinho. Um bagacinho. Um desvio, um poste, um chichi escondido e apressado. Seguiram viagem. Duas paragens. Desviaram para a nacional. Mimosa foi a última paragem antes de chegarem a casa. Chegaram todos bem. Cantaram toda a viagem. 
Temos de convidar a malta para vir ao nosso encontro!
Bem, não se esqueçam que para a semana há ensaio! Saúde!
Filipe Pratas (aqui)

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