Há cerca de 3 semanas, ia eu caminhando na minha rua em Évora quando verifiquei que o calor sufocante desse dia tinha feito derreter o alcatrão num ponto no meio da via e que surpreendentemente por baixo do buraco visível estava uma razoável cratera resultante certamente da deficiente preparação do terreno quando a rua foi arranjada.
Face ao risco implícito avisei a polícia e trinta minutos depois o lugar estava devidamente sinalizado e isolado. Deixei então uma reflexão nas redes sociais, ilustrando com aquele singelo caso as várias dimensões da nossa intervenção cívica. Um dia podemos ter que debater o buraco do ozono ou até os buracos negros do universo, mas no outro dia temos que estar preparados para agir se aparecer um pequeno buraco na nossa rua que pode provocar um acidente se não for tapado.
Acontece que o dito buraco que tão depressa foi isolado e sinalizado, continua a atrapalhar o trânsito e nunca mais foi reparado. Usando de novo as redes sociais fui contando a sua história e foi-se gerando um debate curioso.
Alguns transformaram a metáfora numa imagem potente. Falou-se de um buraco património da humanidade, dum novo tipo de mobiliário urbano, dum cinzeiro embebido na rua. Duma “central” de recolha de lixo. Chamando-se a rua, Rua do Viveiro, houve mesmo quem sugerisse a inovação de se plantar uma árvore no meio da via aproveitando o buraco aberto. Enfim, a nossa imaginação é rica e muito criativa, e brincar dentro dos limites só faz bem ao espírito e ao corpo.
Mas houve outros que levaram a coisa para outro campo e me criticaram por estar a dar relevo ao buraco da minha rua, quando o País e o Mundo estão mergulhados em buracos de outro teor, como o buraco financeiro, o buraco da desigualdade e da pobreza, o buraco dos conflitos armados e do terrorismo ou buraco da erosão dos valores.
Compreendo o seu ponto de vista. Até por isso o debate que o buraco da minha rua gerou foi útil. Mas por mim tenho uma convicção que quero partilhar convosco em jeito de metáfora obviamente. Quem não se preocupa com “o buraco da sua rua” dificilmente terá a sensibilidade a atitude para se preocupar com os “buracos” do seu bairro, da sua cidade, da sua região, do seu continente e do mundo em que vive.
O buraco da minha rua, continua no seu posto no momento em que escrevo este texto. Espero que seja rapidamente resolvido, mas ao menos, enquanto não for, que vá proporcionando um interessante debate de cidadania.
Carlos Zorrinho(aqui)