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Da primavera até finais de Setembro, em muitas casas alentejanas fazem-se “as limpezas”. Estão-lhe associadas caiações ou pinturas, arrumações, implicando muitas vezes pequenas ou maiores mudanças. Cabe, quase sempre, às mulheres promover, decidir e executar estas operações, com ou sem ajuda, mais especializada ou indiferenciada. Os outros habitantes da casa, ou lugar de vida, costumam reagir “às limpezas” e ao incómodo processo de desarrumação e arrumação, ou seja à mudança mesmo que pequena. Umas vezes entusiasmam-se e colaboram; muitas outras alheiam-se, resmungam críticas mais ou menos válidas, distanciam-se simbólica ou mesmo fisicamente. Quando “a casa fica arrumada”, uns expressam o seu agrado pelo “novo” ar limpo e arranjado, outros exibem a sua indiferença, e há mesmo os que manifestam o seu desagrado por não encontrar agora, no lugar do hábito, um certo objecto ou peça do seu quotidiano; mostram o incómodo ou estranheza que experimentam em sua própria casa “por causa das mudanças”.
Este ano, no final de Setembro, as cidades são convidadas a promover “processos de limpeza” e rearrumação nos seus governos locais. Acontece assim de 4 em 4 anos. Nestas ocasiões, uns defendem que todas as peças fiquem no mesmo lugar, outros adiantam que algumas pessoas ou ideias devem ser substituídas, e outros ainda desejam mudanças mais profundas com grandes renovações.
Compreende-se que quem não quer mudar use as suas posições para fazer prevalecer. Estes são, quase sempre, os que estão ao comando das operações, mas contam com os seus pares, e com os mais receosos ou avessos a toda a mudança.
Quem quer mudar experimenta, de facto, as maiores dificuldades. Não são os donos da casa e a mudança depende mais dos outros do que de si próprios, a inércia do poder é-lhes desfavorável.
A decisão cabe aos outros habitantes da cidade, chamados cidadãos.
Os mais empenhados e defensores da limpeza maior, assim como os adeptos da mais suave passagem, andam ansiosos, preocupados, muito focados (ou mesmo sufocados) em todos os pormenores ou nos mais leves indícios do que poderá vir a ser a decisão final. Uma sondagem de opinião publicada pela SIC no final da semana passada era por isso aguardada em Évora com grande expectativa. Com os resultados quase tudo ficou na mesma. Confirmou-se a certeza de que a decisão só será tomada a 29 de Setembro. Se se vai "limpar" mais ou menos profundamente, ou passar apenas “ao de leve” a casa que é conhecida como lugar do poder autárquico, isso só será decidido à última hora. Por agora expressam-se apenas em circuitos pequenos e de confiança pessoal os que já decidiram. Assim, os partidários das limpezas mais profundas comunicam nos circuitos da mudança. Os defensores da mais leve passagem manifestam-se no interior do grupo da continuidade. Uns e outros surpreendem-se com o entusiasmo e com a quantidade de apoios que lhes chegam até porque não acedem ao que se passa nos outros circuitos. Avulta em Évora a falta de espaços de comunicação, para pôr em comum, com urbanidade, tolerância e transparência, o que é relativo à cidade. Assim, entre ditos e mais não ditos, resta-nos esperar até ao fim de Setembro para decidirmos se há limpezas ou se dizemos que não é preciso e deixamos a "trabalheira" para depois.