A Câmara Municipal de Évora anunciou, na passada semana, que o ano de 2016 terminou sem pagamentos em atraso a fornecedores. Surgindo como notícia isolada seria, de facto, uma óptima notícia para o município e para os eborenses, mas importa analisar as circunstâncias que levaram à situação de desequilíbrio financeiro que se traduziu num brutal atraso nos pagamentos e no aumento contínuo da dívida. Importa perceber o porquê de termos chegado até aqui e como é que foi, supostamente, resolvida a situação.
É quase consensual, mesmo para aqueles que sempre votaram PS, que foi o executivo do Partido Socialista que trouxe o município até uma situação financeira insustentável, muito por culpa de uma gestão descuidada e da aceitação de um contrato de gestão das águas com as Águas do Centro Alentejo que acrescentou milhões de euros de dívida sem qualquer benefício para o município. Esta era uma certeza antes das eleições autárquicas de 2013. Todos os partidos denunciaram esta situação e este negócio calamitoso. Pinto Sá, o então candidato da CDU e agora Presidente da Câmara, foi um dos mais destacados críticos desta solução, afirmando que apenas com o controlo municipal das Águas a situação poderia ter uma resolução. Acrescentava que esta seria a grande prioridade do executivo CDU e que junto do Governo batalharia para inverter uma situação que só acrescentava dívida à dívida. Entre a necessidade de ir amortizando os milhões de dívida às Águas do Centro Alentejo e as restantes dívidas a centenas de fornecedores, a gestão do PS foi ter a um beco sem saída. Foi já no final do anterior mandato que o PS decidiu recorrer ao PAEL – Programa de Apoio à Economia Local – um empréstimo do Estado Central de 32 milhões de euros para saldar dívidas a fornecedores. Bloco de Esquerda e CDU opuseram-se a tal empréstimo, mas PS e PSD viabilizaram-no. Trata-se de um empréstimo pago a longo prazo, com uma taxa de juro alta (a rondar os 4%) e que obriga, enquanto a dívida não for saldada, o município a aplicar todos os impostos e taxas no máximo prejudicando, desta forma, todos os munícipes.
Mas como é que chegamos agora ao final de 2016 sem pagamentos em atraso aos fornecedores? O executivo conseguiu tal feito havendo uma nova solução para as Águas e rompendo com o PAEL? Acho que não preciso de responder a esta pergunta, mas para os mais distraídos, não, nada disso.
O contrato das Águas apesar de já não ser com as Águas do Centro Alentejo é com as Águas de Lisboa e Vale do Tejo, seguindo as indicações do Governo. O problema mantém-se tal e qual. A factura anual continua a ser insuportável para o município, pelo que o buraco financeiro não está de forma nenhuma tapado. Mas assim sendo, como foi possível resolver o pagamento das dívidas aos fornecedores? Em primeiro lugar, porque o executivo CDU aproveitou na totalidade o empréstimo PAEL para pagar parte das dívidas. Sim, o tal PAEL tão criticado foi muito útil, ao ponto do executivo não ter tido vergonha nenhuma de anunciar ao longo do mandato resultados positivos, como a diminuição do prazo médio de pagamento aos fornecedores. Entretanto, todos nós, munícipes deste Concelho somos sujeitos a impostos e taxas municipais no máximo permitido por lei, mas parece que isso já não é grande problema. Antes das eleições era para romper com o PAEL. Antes das eleições era um atentado obrigar os munícipes a pagar os erros de gestão. Agora… Bem… Agora, já não se sabe o que a CDU pensa sobre o assunto.
Mas foi só o PAEL que permitiu que a Câmara Municipal anunciasse o fim das dívidas aos fornecedores? Não. A verdade é que o PAEL não foi suficiente, e foi necessário recorrer no final de 2016 a mais um empréstimo, desta vez à Banca, num total de 32,5 milhões de euros. É verdade que desta feita a taxa de juro é mais favorável (a rondar os 2,5%), mas trata-se de mais um empréstimo a longo prazo, mais uma factura de amortização e juro a pagar anualmente, a juntar à factura do PAEL e à factura do contrato da Água que se mantém como grande problema.
É verdade! O município fechou 2016 sem pagamentos em atraso… Mas é caso para perguntar: depois de dois empréstimos no valor de mais de 60 milhões de euros e continuando a não haver qualquer perspectiva de solução para a gestão da água, onde está a boa notícia? Aliás, não é por acaso que o comunicado da Câmara contém uma frase do senhor presidente bem elucidativa. Diz Carlos Pinto Sá: “Não garantimos que, numa situação ou noutra, não surjam derrapagens em relação ao previamente acordado com o fornecedor”… Pois… Ainda não estão reunidas as condições para não derraparmos, antes pelo contrário.
Até para a semana!
Bruno Martins (crónica na radio diana)