E pronto, lá temos um governo que se atirou à sua tarefa num ambiente de pioneirismo que acorda esperanças, mas também receios, como qualquer estreia.
A novidade política deste 21º Governo de Portugal assume-se, atrevo-me a dizer, como uma espécie de Democracia 2.0. Ou seja, e para me fazer entender pelos menos habituados à linguagem da informática e tecnologias, uma versão atualizada do que tínhamos antes.
Avaliados todos os requisitos legais fundamentais para que tudo isto não descambe para outra coisa que não seja a “boa da Democracia”, que até nos países que ainda são reinos também se instalou, lá se atreveu o Presidente da República a seguir as regras e fazer, mais ou menos contrariado sabe-se lá porquê, o que tinha de fazer. E ao contrário do que acontece quendo se seguem as rotinas e que, muitas vezes por inércia, vamos aceitando como “normal”, este momento político é em si-mesmo um momento fraturante. É-o até por exigir que se esteja um pouco mais atento aos palcos da política, talvez resultando, oxalá, numa participação mais expressiva, porque esclarecida, dos eleitores quando tocar a ir às urnas.
Mas não podemos menosprezar o papel dos meios de comunicação social, sobretudo os amadores, e falo das redes sociais, que replicam tantas vezes irrefletidamente a opinião dos, em princípio, profissionais. Não haverá uma democracia sem informação dos cidadãos e, como tal, são aqueles que tratam dessa parte da vida política também atores principais do sistema. Com direito às leituras pessoais num espaço claramente identificado como de opinião, há que não confundir entre o facto e o que se constrói em torno dele. E se de opiniões vamos tendo para todos os gostos e ocasiões, os factos são o que mais difícil, em meu entender, é de transmitir pelos órgãos de comunicação.
Nos dias que correm, e já há muito, não é de agora, não é raro assistirmos e se estivermos atentos, só um bocadinho, como um mesmo indivíduo pode, contraditoriamente, citar uma fonte vociferando de espanto e indignação, para uns dias depois aceitar a dúvida levantada por essa mesma fonte, com o argumento de que onde há fumo há fogo. Ora, se partirmos de um princípio em que, não promovendo a desconfiança mas aconselhando um ceticismo razoável (sempre o instável razoável!) seria prudente fazermos sempre que necessário várias perguntas antes de darmos a nossa própria resposta a uma questão. Poderemos assim ser sempre melhores leitores do que se passa no mundo e à nossa volta.
O Vergílio Ferreira às vezes, muitas, irritava-se com os Portugueses, alguns Portugueses digo eu, tal como outros prosadores e poetas, como o Eça ou até o Camões que põe um ponto final às aventuras dos bravos Lusíadas com a palavra “inveja” (e isto tem de significar qualquer coisa, não está ali só para rimar!). E Vergílio escreveu um dia que nós, os Portugueses, "Somos um povo de analfabetos. Destes há alguns que não sabem ler." Longe de poder parecer um desabafo elitista, o pensador português sabia que nem todos os que têm a oportunidade de aprender, aprendem. O que é uma pena, mas enfim, cada um sabe de si…
Até para a semana!
Cláudia Sousa Pereira (crónica na radio diana)