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Viva o José do Telhado! (III)

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Joaquim Palminha Silva












III

Com alguns assaltos efectuados de forma desusada o Poder tomou conhecimento da aventura do chefe bandoleiro e, precisamente pelo perigo que a sua acção social representava, “levantou-lhe um processo”…
            A mulher, ao conhecer-lhe a actividade e a sua perigosidade, quis suicidar-se e ele “chorou” a sua sorte, dizem que então jurou tornar-se “honrado”. Como muitos outros pequenos agricultores arruinados pela política agrária liberal, seguiu o caminho da emigração, na mira de angariar pecúlio que lhe evitasse a brutal proletarização. Embarcou para o Brasil numa dessas miseráveis embarcações de acrga que, ao mesmo tempo, para obter máximo lucro, fingiam ser navios de passageiros, amontoando pessoas na coberta da proa como gado. O veleiro (barca?) que levou José do Telhadoà América do Sul chamou-se Oliveira.
            Supõe-se que vagueou pelo continente sul-americano, “sem eira nem beira”, em demanda de situação vantajosa… A sua estadia no Brasil é ignorada pelos biógrafos, o seu registo escasso. Por fim, retornou a Portugal, desalentado, mais desgraçado. Terá então verificado quanto lhe era difícil uma saída de subsistência económica digna, com os administradores políticos da Comarca saídos do partido vencedor, partidários da Rainha e seu ministro ditador (Costa Cabral), que não se cansavam de perseguir nele o antigo combatente patuleia, o soldado valente da Revolução da Maria da Fonte… Experimentador dorido de insolvências e hipotecas, ganhou ódio aos enriquecidos proprietários, aos situacionistas do regime, aos politiqueiros locais, engordados à sombra de um liberalismo de circunstância e compadrio.

Embarcação de transporte de emigrantes, 2ª metade do século XIX.

Surge então, por forças das circunstâncias, o José do Telhado de que a “sociedade” do Poder Político e do Capital de fresca aquisição, na sua prática tradicional da injustiça social, acabara de forjar. Porém, no seio da população rural empobrecida e sem protecção, o personagem, segundo quer o mito mil vezes repetido e retocado, foi intitulado de «repartidor público» e não salteador das serras e dos caminhos. Estamos, pois, face a um “ladrão” à Shiller, “filósofo” da acção directa, precursor dos vingadores da «Mão Negra» …
Assaltou os ricos lavradores do Marão e suas cercanias, fartou-se de dinheiro e, ao topar no seu caminho pobres jornaleiros ou lavradores a beira da ruína, como ele já o fora, deu-lhes moedas de oiro para os aliviar, e estes aceitavam a oferta de bom grado e sobejamente agradecidos ao “salvador” de ocasião. Roubou juntas de bois aos ricos e levou-as aos casais de pobres lavradores que delas necessitavam. De uma vez pagou as custas do baptismo ao filho de uma pobre mulher, que o avarento do Pároco exigia, para tornar o inocente alma cristã!
No terreno da revolta social, José do Telhado tornou-se rebelde singular, sem projecto político, é verdade, mas um efectivo justiceiro dos caminhos, com traços de personagem romântico a pedir um romance ou, já no século XX, peça de teatro, e um filme que, apesar da veracidade histórica ter sido distorcida por razões que se percebem muito bem, chegou a ter algum êxito.

                  
 Filme de 1945, com Vergílio Teixeira e Adelina Campos.


                                                                                                           (continua)

Viva o José do Telhado (I)
Viva o José do Telhado (II)

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