(Este é o texto que li na AM de 5 de Maio de 2015)
LIBERDADE
Digníssimos representantes do Povo do concelho de Évora o incidente que ocorreu nesta Assembleia no período concedido para intervenção ao chamado público não pode passar em claro.
Quando comemoramos os quarenta e um anos do 25 de Abril, data em que um punhado de capitães restituiu ao Povo a LIBERDADE e em particular a LIBERDADE DE EXPRESSÃO, recordo um acontecimento que me marcou profundamente como cidadão.
Antes do 25 de Abril realizou-se na Sociedade Joaquim António de Aguiar uma sessão cultural (penso que de poesia) com a presença do poeta Ary do Santos, o apresentador Igrejas Caeiro e o ator Rui Mendes. A sala estava completamente cheia de opositores ao regime e, como era hábito nestas sessões públicas, estavam também presentes três elementos da PIDE. O poeta Ary dos Santos iniciou a sua intervenção com uma frase que me arrepiou “ Aviso esses senhores que estão sentados ao fundo do lado direito que não temos medo deles, não nos calaram nem àqueles que lutam pela LIBERDADE”. Percebi então que quando se luta por uma causa justa não há medo, há a força da razão que, neste caso, era a luta pela liberdade de pensamento.
Este sentimento fez aumentar o meu empenho na luta contra a ditadura fascista.
Lembrando o poeta não me calei quando um pide me agrediu e gritei abaixo o fascismo. Não me calei quando um pide quis que lhe entregasse um gravador à saída das comemorações do 31 de Janeiro e gritei viva a liberdade.
Felizmente deu-se o 25 de Abril.
Aproveito para saudar o Capitão Cardoso um dos capitães de Abril.
Já em regime democrático, não me calei quando fui detido pelo MFA, por fazer parte de um comité de greve dos trabalhadores do comércio. Não me calei quando no meu sindicato se lutava pela liberdade sindical. Não me calei quando um grupo de oportunistas quis alterar a decisão tomada pelos moradores no movimento de ocupação de casas devolutas. Não me calei quando um grupo ligado a um partido tomou conta de uma Cooperativa de consumo que ajudei a fundar. Não me calei quando tão difícil era no Alentejo sair à rua e gritar “nem fascismo nem social-fascismo, independência nacional”. Mais uma vez em todos estes acontecimentos lembrei-me do poeta.
Em 30 de Abril de 2015, na Assembleia Municipal de Évora, estando a intervir como munícipe no período concedido ao chamado público, fui inopinadamente interrompido pelo seu presidente, sem que tenha cometido qualquer crime (injuria, insulto, ofensa, provocação ou outro). Quando tentei manifestar a minha posição, fui impedido de continuar a falar.
Calei-me por respeito para com o órgão.
Depois de ouvir intervenções de diversos elementos sobre o incidente, quero enaltecer todos aqueles que colocaram o princípio que prevaleceu no grupo de trabalho de alteração ao regimento de funcionamento no sentido de serem criadas condições para a intervenção dos munícipes, através da introdução de um período de 15 minutos antes da ordem de trabalhos, ao contrário de outros que a pretexto de minudências burocráticas tentaram justificar o comportamento do presidente.
Não tendo visto reprovado devidamente o comportamento do presidente e tendo este reiterado a sua convicção no mesmo, jamais aceitaria falar naquele período.
Mais uma vez lembrando o poeta não me vou calar.
Como cidadão e munícipe fui candidato AM nas primeiras eleições. Voltei trinta anos depois a assistir a AM ainda no anterior mandato. Não fiz qualquer intervenção nas mesmas por motivos que já referi numa assembleia anterior.
Concorri à AM pelo BE nas últimas eleições. Não fui eleito, entendi contudo que, poderia dar um contributo como munícipe preocupado com o futuro do Concelho. O exercício da democracia não se esgota na representação, deve ser participada.
Neste sentido participei de uma forma que, penso, empenhada em várias assembleias expondo problemas que conheço ou que me são transmitidos por outros municipes.
Este comportamento é igual ao que tenho na minha freguesia.
Tenho procurado incentivar e motivar os munícipes com quem me relaciono ou que me procuram no sentido de participarem eles próprios na vida do município. Felizmente o número de participações tem aumentado e já não estou só no chamado público.
A propósito quero mais uma vez agradecer aos digníssimos representantes do concelho, tal como fiz na intervenção que foi interrompida, a possibilidade que é dada ao público de intervir antes da OT.
Fui eleito pela AM para o Concelho Municipal de Segurança no qual tenho participado, não faltando a qualquer sessão até hoje realizada, ao contrário de outros que ainda não tive a oportunidade de conhecer.
No seguimento deste meu comportamento procurei mais uma vez intervir nesta AM no período que está regulamentado. Não me foi permitido.
Lamento e repudio o comportamento autoritário e antidemocrático do presidente da AM.
Autoritário porque inopinadamente, sem consultar os outos membros da mesa, abusou dos seus poderes e interrompeu a minha intervenção sem que nada o justificasse.
Recordo que me foi concedida a palavra, porque foi chamado a atenção pelos colegas, que eu tinha levantando por duas vezes o braço para esse efeito, enquanto outra munícipe intervinha.
Reconheço que as condições visuais e auditivas não serão as melhores, tal como as dadas ao público para intervir (não existe um espaço próprio, tem que ser um deputado a ceder o seu espaço físico), mas isso não justifica tudo. Mas sobre a competência não posso fazer nada uma vez que não sou deputado.
Antidemocrático porque quando procurei contraditar o seu comportamento ameaçou e concretizou o mesmo com o corte da palavra.
Como corolário desta situação não usarei mais da palavra na AM. Farei chegar os assuntos através dos representantes eleitos.
Parafraseando o poeta “poeta castrado não”, aqui “munícipe castrado nunca”.
Viva o 25 de Abril, viva a LIBERDADE.
José Manuel Dias