Joaquim Palminha Silva |
Em tempos recuados, foi sentido como nunca aquilo que Pico della Mirandola (1463-1491) chamava dignitas hominis, enquanto agora o impulso bárbaro e inclassificável, mais baixo do que todas as maldades que envergonham a Humanidade, surgiu inesperadamente no estreito da Sicília, a bordo de uma arruinada embarcação carregada de pobres e miseráveis norte-africanos, que clandestinamente demandavam a Europa. – Um grupo desses miseráveis, a quem o fanatismo de raiz islâmica roubou a paz de espírito, atirou às águas do Mediterrâneo, com o objectivo de os assassinar por afogamento (o que foi conseguido), um grupo de outros miseráveis que os acompanhava, pela simples razão de que eram cristãos!
Se isto não tivesse acontecido, talvez os indiferentes que dominam a União Europeia, os comissários impassíveis e astuciosos, os ateus praticantes, sobre quem a nossa sofrível indulgência costuma recair; dizia, talvez continuassem a praticar o seu materialismo triunfador sem peso na consciência… - Mas agora, depois deste testemunho sobrevivente de séculos bárbaros e de misérias sem classificação, o exercício do Poder político na União Europeia tornou-se cúmplice indirecto, por negligência calculada e por todos os países consentida, destes testemunhos sobreviventes de passados séculos de escravidão sangrenta e de civilizações renegadas, anti-cristãs.
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O Rei Lear (de Shakespeare), velho e completamente demente, fala à filha da existência de vigias de Deus, o que só prova a sua loucura dado que Deus, tendo criado o Universo e sendo omnividente, não precisa de enviar vigias para o planeta, para que depois lhe façam o relato de como na Terra, os seus habitantes, lhe procuram desfazer a obra!
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Todavia, há pessoas que revelam aos distraídos e aos indiferentes aspectos inobservados da realidade, bem como a relação misteriosa entre seres, pensamentos e acontecimentos, tanto benignos como malignos. Neste sentido, estas pessoas podem ser consideradas «vigias do mundo». Às vezes, podemos imaginar surpreender aqui e além um pormenor, um facto que julgávamos para sempre recolhido na petrificada barbárie de passados milénios…
Não é verdade que tudo já tenha sido dito; que tudo o que havia a escrever tenha sido escrito; que todas as imagens que convinha guardar tenham já sido registadas pela pintura, pela fotografia e pelo cinema. Na Natureza e na História da Humanidade há ainda muitos ângulos por iluminar, muitas questões por esclarecer, muita indiferença por explicar…
O carácter fragmentário do mundo, apesar da globalização, apresenta muitas correspondências de diversos egoísmos, que nem sequer são vizinhos… Os «vigias do mundo» não descobrem tudo quanto desejariam para emenda dos homens, mas sobre a essência e a aparência da barbárie actual, que encarcera no mal e suja de iniquidade o século XXI, isso tem sido revelado todos os dias…