Joaquim Palminha Silva |
Aqui mesmo ao pé da porta, podemos ver como tudo se conjuga para continuar a série, em folhetins pitorescos, do título Alentejo extravagante!
Por isso… Isto vai agora em tom de ironia prazenteira, porque nos parece melhor não azedar muito as susceptibilidades (não vá o diabo tecê-las!) de quem manda alguma coisa e têm a seu cargo a gestão de uma “máquina” melindrosa, chamada «Segurança Social do Centro Distrital de Évora» …
Dantes até o chão, lavrado de pedras, nos recordava a tortura de um “povo” de “forçados”… Agora, Reguengos de Monsaraz (que já é cidade!), com as terras circunvizinhas transformadas em autêntico «País das Uvas», foi galardoada capital europeia do vinho! – Depois… há essa grande “engrenagem” que fez o cante ser património imaterial da Humanidade… Entretanto, as visitas de estrangeiros à “reserva” turística para ricos, perdão, ao Alentejo, aumentaram de número, dizem as estatísticas. Resumindo, as palavras das minhas crónicas têm cheiro a velharia e, quem sabe, pensarão os leitores mais desconfiados, possuem ressaibos de um pessimismo inconfessável, de quem não sabe nem quer ver a transferência de tanta “coisa óptima”, para o imediato aumento da qualidade de vida dos habitantes da terra transtagana. Vejamos…
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Quando as “extravagâncias” parecem finalmente adormecidas, surge num mensário regional (Folha de Montemor, Março/2015) a entrevista duma senhora de maquilhagem simpática (reproduz-se a capa do jornal), dirigente da administração pública, com uma declarada vocação de vidente! – Este raro atributo humano é algo “novo” na administração pública do País e, mais uma vez, cabe ao Alentejo o papel de “vanguarda” na prática da “adivinhação”.
Numa linguagem de tapume e cartomancia, a senhora directora da Segurança Social do Centro Distrital de Évora, a determinado passo da entrevista, confessa-nos: «não tenho uma varinha mágica»; porém, logo adiante, não resiste e, deslumbrada, confidencia-nos que é «[…] capaz de vislumbrar um futuro risonho para o Alentejo, região com muitas potencialidades…»!
Depois, dando asas ao seu entusiasmo, numa grandiosa síntese “esotérica”, própria para ser entendida só pelos “iniciados” (sublinhamos as misteriosas palavras!), a senhora directora, sagaz e penetrante, explica-nos o seu vaticínio: «Os números do turismo mostram que este pode ser um grande pilar de alavancamento em termos de desenvolvimento e de economia local. Apostar na atracção de serviços e na possibilidade de termos algumas empresas que podem ser uma fileira de captação de investimento, e reforço dos clusters existentes. […] Pela primeira vez vamos ter um eixo de inclusão social que permitirá implementar respostas sociais inovadoras.».
Eu não sei, muito infelizmente para mim, o que seja «um grande pilar de alavancamento»; imprudente, ignoro como se pode tentar a sorte e «Apostar na atracção de serviços»; não faço a menor ideia do que seja «uma fileira de captação de investimento»; de entendimento enevoado e comezinho (deve ser da idade!), não entendo o que seja o sábio detalhe “esotérico” do «reforço dos clusters existentes»; com minha grande mágoa e desproveito não consigo imaginar um «eixo de inclusão social» e, por conseguinte, mesmo que me puxem as orelhas, como antigamente os professores faziam aos meninos cábulas, não atino com o que seja «implementar respostas sociais».
Basta!… Creio que já tagarelei demasiado sobre a minha ignorância. Mas eis que a senhora directora, como que “adivinhando” a minha desditosa pouquidão de entendimento, no derradeiro parágrafo da entrevista, tem a caridade de explicar, com exemplos ad hoc, parte do «futuro risonho» que diz «vislumbrar»: - «Évora é património mundial. Vendas Novas certificou a bifana. Arraiolos o tapete, temos o triângulo da pedra, a doçaria de Viana.»…
Caso surpreendente! Sobretudo surpreendente para mim, porque acabo de descobrir, como é patuscamente importante a bifana de Vendas Novas se parceira do patrimómio monumental de Évora; como é sublime o tradicional e artístico tapete de Arraiolos se acompanhado pelo extravagante «triângulo da pedra» (não confundir com o célebre «triângulo das Bermudas») e, para terminar tudo com a sensação dum doce sonho, fiquemo-nos, pois, pelo oportuno desvairamento da «doçaria de Viana».
Todavia… Ah! Os números do Instituto Nacional de Estatísticas (INE)…
Segundo dados de 2012, a população residente no Alentejo foi estimada em 501.747 almas, com o suplemento de ser a população mais escassa e mais envelhecida de Portugal continental, com 25% de pessoas com 65 e mais anos, assinalando-se um decréscimo populacional entre 1999 e 2012, enquanto nas restantes regiões se manifestou um aumento populacional.
Um «futuro risonho» para o Alentejo?! Ah!, senhora directora, pelo feitio rotundo do seu verbo, pelo afinco casuístico da sua “visão”, tem V. Exa. seguramente um lugar entre os “imortais”, que a sabedoria popular há muito pôs em versos, medíocres mas justiceiros:
«Pilriteiro, que dás pilritos…
Porque não dás coisa boa?
Cada um dá o que tem,
Conforme a sua pessoa.».