Joaquim Palminha da Silva |
Uma população com “estatuto de cidadania” que não cuida da Nação por negligência generalizada, associada a “tradicional” preguiça mental, quando ela mais necessita de atenção e inteligência que a socorra, bem como de solidariedade que a recupere, desampara-a. Porém, se o faz quando a Nação se encontra num iminente risco de perecer ou sacrificar a sua honra, que é como quem diz a sua independência, identidade cultural e liberdade de decidir por si própria o seu destino, então tal população desce ao mais desprezível estado mental que se pode imaginar, pois ao abandonar a Nação, opta pelo abandono das suas raízes, renegando-se a si própria. Para empregar um lugar-comum japonês, essa população passa a praticar diariamente um psicótico hara-kiri!
A situação do País deve o seu trágico estado à orquestrada malicia e egoísmo das minorias que o têm governado, seja qual for o partido político destas minorias: - Bancos a falirem; corrupção ao mais alto nível e em contínua aceleração; grande volume de capital a fugir para paraísos fiscais; empresas portuguesas a abrirem sedes no estrangeiro; património empresarial (e não só) do País vendido a interesses estrangeiros; baixo ou nulo investimento na investigação científica; Bolsa de valores a cair estrondosamente; baixa dos níveis médios de solidariedade e assistência na saúde, na educação, na protecção social e, consequentemente, nível de vida material da população em queda abismal, atirando para a pobreza perto de 2,5 milhões de portugueses, “acreditando” nas estatísticas oficiais (o que quer dizer que á muito maior o seu número).
No entanto, a situação do País deve-se também ao relaxamento da maioria dos cidadãos, que praticam um desdém repreensível e uma inconsciente indiferença por tudo o que não seja as suas vidas individuais.
Desde há 20 anos (pelo menos) que a má governação praticada pelas minorias, entretanto escolhidas nas urnas de voto pelas maiorias, se tornou o bode expiatório de todas as desgraças de Portugal, como se fosse logicamente possível responsabilizar exclusivamenteas minoriasde escroques que nos governam, por decisões cuja prática as maioriasé que autorizaram com os seus irracionais e “democráticos” votos.
Não é preciso ser especial “pesquisador” do “inédito” e do “pitoresco” para recensear imensa quantidade de “curiosidades” e “ruínas” mal pressentidas, postas na sombra do esquecimento, ignoradas por inexplicável cegueira do cidadão comum, que dão ao País a fisionomia, a “cor” do desleixo, enquanto atributo sui generis da maneira de ser dos portugueses, transformando os habitantes numa multidão de relaxados que subsistem numa terra de lixeiras, supostamente protegidos por tetos de cartões podres!
Na verdade, há saliências na vida dos indivíduos como na vida das Nações, as quais justificam à saciedade poder atribuir-se-lhes qualidades ou defeitos colectivamente partilhados. No caso concreto, podemos apontar o desleixo como a fisionomia geral do País, servido por uma maioria populacional que, aos mais diversos níveis, fez do relaxamentouma forma de ser e estarnatural. O relaxamento da população portuguesa é presenciado à vista desarmada pelo visitante estrangeiro, ao dobrar cada esquina de rua, mas nunca é assumido pelo cidadão comum como coisa real: - Este último, fiica mesmo ofendido se lhe lembram que não se escarra para o chão, que os papéis não são para atirar ao vento, que aquilo que se danifica por desgaste do tempo é para reparar imediatamente, e não para abandonar até à podridão!
Nunca outro “atributo” denunciou tão insofismavelmente o descaro com que se afirma esta desamparada forma de viver e administrar o espaço territorial e humano que consubstancia Portugal: - Desleixo!
De posse dos principais fios da teia burocrática que compõe o Poder político central, regional e local, os políticos (os relaxados de cima!) despoletam imediatamente um “iluminado” discurso verbal, com diatribes e alucinações palavrosas sobre grandes “linhas de rumo”. Envernizando as suas “almas” enxovalhadas com as cores de limpos propósitos, revelam-se todavia incapazes de gerir a tempo e horas a mais simples recuperação do empedrado das ruas de cidades, vilas e aldeias lusitanas, para só citar a mais prosaica das questões. Relaxados de cima que se supõem argutos e enérgicos raciocinadores, inauguram escusadas discussões sobre a sua autoridade institucional, sobre o seu pacto indissolúvel com inúmeras organizações internacionais, etc., arrastando para polémicas despropositadas os partidos adversários de outros relaxados. Mas à medida que o tempo corre, verifica-se que apenas se distraíram da gestão do bem público e esqueceram aquilo para que foram eleitos. Mas diga-se, com forte desapontamento, que a este estado de coisas não responde nenhum motim dos relaxados de baixo, porque afinal de contas os de cima e os de baixo são massa da mesma levedura. Ambos, portanto, exacerbados relaxados no que respeita questões concretas que fazem de uma Nação um espaço cultural respeitável e respeitado, no seio das nações europeias…
Desde as obras públicas de Governos (às vezes encenações em betão!) até aos sanitários públicos, os serviços materiais da República estão minados pelo vírus do desleixo! Podemos mesmo dizer quer a atmosfera do desleixo que os relaxados(de cima e de baixo)respiram é tão densa como o próprio oxigénio!
O que parece ter uma importância extrema para que o mecanismo social funcione, por obra e graça dos relaxados de cimae de baixo, passa a não ter importância nenhuma, o que parecia indispensável à vida quotidiana da República, sem o que não conseguimos dar um passo, reduz-se a zero. Assaltado pelo desleixo do Minho ao Algarve, Portugal tornou-se uma terra suja, feia e ordinária. Não vale a pena esclarecer e discutir esta afirmação com a esmagadora maioria de relaxados, pois estes, só conhecendo o desleixo, não estranham a lôbrega enxovia em que se tornou o País…
E, assim, enquanto os diversos deputados da Nação dão as mais “naturais” cabriolas, os ministros se sucedem em pinchos extravagantes, as forças da Ordem montam as suas tendas de “secos e molhados”, entre uma e outra sessão de pancadaria a manifestantes e desempregados, as empresas públicas levantam os seus vestidos sem pudor e vendem o corpinho ao “primeiro estrangeiro” que aparece, o cidadão anónimo, baseado neste procedimento geral de relaxamentoem série, devolve em aparas miúdas o desleixo que os relaxados de cimalhe despejam em blocos… - E vota sempre maioritariamente no mesmo tipo de escroques!
Enfim, o mundo subterrâneo pôs-se a caminho… Há sempre um canto de rua onde o lixo remexe continuamente movido pelas ratazanas! Há sempre um suposto descendente de Viriato a expelir, conforme a fantasia dos seus pulmões, um escarro desdenhoso no pavimento, ao lado do património classificado!
Aqui é tudo brando e “simpaticamente” barato: - O relaxamento, o desleixo, o desarranjo geral, os costumes e a falta de higiene mental (e não só)! Eis porque ainda há turistas de “mau gosto” a passar a fronteira…