Face às recentes notícias veiculadas pela comunicação social de que estará para breve (em Setembro) a primeira tentativa de reintrodução do Lince-ibérico em território nacional, mais propriamente no Vale do Guadiana, a Quercus vem demonstrar a sua apreensão sobre aquilo que nos parece ser um processo demasiado apressado e pouco transparente.
Esta situação motivou mesmo que a Quercus tenha solicitado informações detalhadas junto do ICNF – Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas, nomeadamente o acesso aos relatórios técnicos com os resultados dos trabalhos realizados em Portugal e Espanha nas zonas pré-selecionadas que serviram de base à decisão que foi tomada, solicitação que não teve qualquer resposta do referido Instituto e que deveria ser disponibilizada de imediato.
Na base do pedido de esclarecimento estão dúvidas relacionadas com os critérios de base na seleção das áreas a intervir, neste caso o Vale do Guadiana, nomeadamente ao nível da existência de um continuum de habitat favorável que permita albergar uma população viável deste felino fortemente ameaçado e existência de populações de coelho bravo suficiente para manter uma população de lince, mesmo em períodos cíclicos em que as presas sofrem uma forte regressão devido a doenças como a mixomatose e a doença hemorrágica viral. Desconhece-se igualmente o grau de compatibilização da presença da espécie com as atividades agroflorestais e da exploração cinegética nas áreas selecionadas e em que medida serão minimizados os impactos do lince sobre as mesmas, porque as informações disponíveis enfermam de uma simplificação excessiva.
Acresce que a Comissão de Acompanhamento Externa no âmbito do Plano Ação para a Conservação Lince-ibérico não reúne desde 2010, uma situação que consideramos incompreensível, atendendo a que, dada a elevada complexidade da operação e os riscos associados a esta fase do processo, deverá procurar-se o máximo consenso possível e que a adesão ao pacto de todas as partes se faça de forma informada.
Por outro lado, considerando a proximidade das eleições legislativas no próximo ano, teme-se que possa haver neste processo alguma tentativa de instrumentalização política de uma decisão que deve reger-se por critérios técnicos exigentes e inquestionáveis, visto que uma má decisão numa fase inicial pode não só comprometer o sucesso da reintrodução da espécie, mas também a manutenção de um compromisso alargado a toda a sociedade portuguesa. Também não nos parece que estejam assegurados os recursos financeiros adequados para que o ICNF possa garantir a continuidade deste processo no futuro, pois trata-se de uma estratégia que necessita de ampla mobilização de recursos públicos no longo prazo, cuja implementação não pode estar apenas dependente de um empenho momentâneo dos governantes, mas deve envolver e comprometer futuros atores.
Lisboa, 3 de julho de 2014
A Direção Nacional da Quercus