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Channel: A Cinco Tons
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Carlos Júlio

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Ponho de lado quase 25 anos de fortes laços. Deixo à margem a amizade profunda. Deixo de lado os afectos normalmente causadores de olhares enviesados, apreciações subjectivas, análises injustas.

O jornalismo no Alentejo é alvo de profundos abanões nos últimos quatro, cinco anos. Sem perder tempo a enumerar os problemas, sigo directo ao assunto: Com o despedimento de Carlos Júlio a TSF acaba de cravar fundo o machado na delicada raiz do jornalismo que por cá se vai fazendo.
Se é uma má notícia para a região, é uma péssima notícia para o jornalismo deste país, que se vê privado de um dos seus maiores profissionais dos últimos 30 anos, figura incontornável da rádio, um dos obreiros da construção da TSF - daquela TSF que lá atrás foi farol para a renovação do jornalismo no Portugal democrático.
Ao serviço da RDP, primeiro e da TSF há quatro anos, foi distinguido com o mais alto galardão do jornalismo em Portugal, o Prémio Gazeta, sendo dos poucos no país com duas distinções.

Carlos Júlio é marca de seriedade. De competência. É sinónimo daquela que é a mais importante e difícil qualidade no jornalismo e que hoje em dia escasseia nas redacções: CREDIBILIDADE.
Credibilidade não é algo que se compre na drogaria, se estude na faculdade, se embrulhe em qualquer mestrado ou doutoramento. A credibilidade conquista-se com anos e anos de trabalho sério e continuado.
Numa altura em que o jornalismo é diariamente vilipendiado por gente que despudoradamente o maltrata por incompetência, medo e suborno, o jornalismo deixa de contar com uma personalidade frontal, convicta do papel e do poder do jornalista. Alguém que não se verga aos interesses partidários/políticos/económicos. Que faz da independência escudo para o exercício da arte de informar.

Carlos Júlio É, pois, um grande jornalista. Não foi mais além nas hierarquias, sei-o bem, primeiro por ser contrário ao seu feitio. Também porque decidiu um dia deixar a confusão da cidade grande e rumar ao sul. Ao seu Alentejo onde ficou e permanece preso de Amores.
Nos últimos 30 anos além do Alentejo fez reportagem em todos os cantos do país. Esteve em alguns dos mais marcantes momentos da vida política e social de Portugal. Fez inúmeras campanhas eleitorais. Realizou dezenas de programas por todo o país, chegando a ser companhia permanente no “Terra a Terra” nas manhãs de sábado.
Ao longo de quase um quarto de século na TSF, Carlos Júlio não foi correspondente em Évora. Carlos Júlio foi, é, repórter do mundo. De todo o mundo por onde passou cobrindo conflitos, as mais sangrentas guerras.
Esteve mais que uma vez, sempre que os tiros soaram, em Timor, na Guiné, em São Tomé e Príncipe. Passou semanas no Afeganistão. Esteve na ex-Jugoslávia, no sangrento conflito do Kosovo – onde viu a morte perto quase atingido por fogo “amigo” cuspido por F16 americanos que acabaram por matar o seu guia/motorista.
Do México a Cabo Verde e por muitos outros países, calcorreou quilómetros Espanha adentro sempre em reportagem. Por onde passou Carlos Júlio pintou retratos do quotidiano, da actualidade que marca a vida das populações.
Fez do jornalismo e da rádio a sua paixão maior.

A TSF não extinguiu um posto de trabalho. A TSF pôs na rua um profissional de créditos firmados. Marca de seriedade. De competência. De credibilidade.

A TSF não extinguiu um posto de trabalho.
A TSF deu um passo largo rumo à extinção.

Pelo contrário, Carlos Júlio há-de continuar jornalista. Junto com ele, meu grande mestre desta arte efémera como tão bem a descreveu Pedro Ferro, havemos ainda de pautar o andamento das notícias nesta nossa Pátria.

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