O PCP apresentou ontem, pela quarta vez, um projecto de resolução pela renegociação da dívida pública e pela quarta vez o resultado foi o mesmo, tendo o PS, o PSD e o CDS votado contra a proposta que a bancada comunista apresentou.
A única diferença entre este projecto de resolução e os anteriores, é que este é apresentado após a divulgação de um manifesto subscrito por alguns supostos senadores da República reclamando a reestruturação da dívida pública.
Lembro as declarações de alguns militantes do PS quando durante mais de uma semana se discutiu o conteúdo do dito manifesto, acreditando que a direcção do seu partido acompanharia as propostas nele contidas.
Bastou a ida à Assembleia da República de uma proposta de resolução para se desfazer a ideia de que o PS teria mudado de lado e abandonado a troika interna passando-se para o lado da maioria dos portugueses.
Não foi assim, como se pode verificar pela votação mas em particular pela violência das intervenções contra a proposta do PCP.
Dir-me-ão que a proposta do PCP é diferente da constante do mediático manifesto. Concordo. A proposta da bancada comunista aponta para a necessidade de renegociação da dívida nos juros, prazos e montantes e aponta para um caminho de políticas de defesa e reforço da produção e do investimento, que permita o crescimento da economia e um eficaz combate ao desemprego.
Mas ainda assim existe uma base de convergência, cada vez mais alargada, de que a dívida pública é insustentável e que o caminho seguido até agora levará ao empobrecimento generalizado da maioria dos portugueses, sem a contrapartida de ver reduzida a dívida.
Parece que fora deste consenso alargado estão apenas os partidos que assinaram o memorando com a troika externa e o senhor de Belém, tão bem caracterizado por Alexandra Lucas Coelho na cerimónia em que recebeu o grande prémio de romance da APE.
A posição assumida hoje pelo PS na Assembleia da República faz-nos pensar que o significado da palavra mudança, que ornamenta agora os cartazes de pré campanha eleitoral, tem tanta correspondência com a realidade como a utilização da palavra irrevogável pelo ministro de estado do CDS.
A mudança que nos propõem parece ser o famoso salto da frigideira para o lume, depois de termos saltado do lume para a frigideira quando passámos do PS para o PSD/CDS.
Dizia-se no projecto apresentado pelo PCP: "Hoje, mais do que nunca a questão está em saber se se rompe com a política de direita, se se assume uma política patriótica e de esquerda que tenha como primeira e importante decisão a renegociação da dívida pública em benefício dos trabalhadores, do povo e do país, ou se se permite que o país continue a ser arrastado para o desastre."
A votação de ontem foi esclarecedora sobre de que lado se coloca o PS.
Até para a semana
Eduardo Luciano (crónica na radio diana)