De banquete pra banquete,
Quem produz e quem trabalha
Come açordas sem "azête"
Ainda o que mais me admira
E penso vezes a miúdo:
Dizem que o sol nasce para tudo
Mas eu digo que é mentira.
Se o pobrezinho conspira
O burguês com ele ralha,
Até diz que o põe à calha
Nem à porta o pode ver.
A não trabalhar e só comer
Não vejo senão canalha!
Quem passa a vida arrastado
Por se ver alegre um dia
Logo diz a burguesia
Que é muito mal governado,
Que é um grande relaxado,
Que anda só no bote e "dête".
Antes que o pobrezinho "respête"
Tratam-no sempre ao desdém
E vê-se andar, quem muito tem,
De banquete pra banquete.
É um viver tão diferente
Só o rico tem valor.
E o pobre trabalhador
Vai morrendo lentamente.
A fraqueza o põe doente
E a miséria o atrapalha;
Leva no peito a medalha
Que ganhou à chuva e ao vento
E morre à falta de alimento
Quem produz e quem trabalha
Feliz de quem é patrão
E pobre de quem é criado
Que até dão por mal empregado
O poucochinho que lhe dão.
Quem semeia e colhe o pão
Não tem aonde se "dête",
Só tem quem o "assujête"
Para que toda a vida chore,
E em paga do seu suor
Come açordas sem "azête""
JAIME DA MANTA BRANCA, poeta popular
(Benavila, 1894 – Cano, 1955)
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