A presença de um ex primeiro-ministro na inauguração de uma infra-estrutura pública seja qual for a sua natureza, não deverá ser noticia. Mas, a presença de um qualquer ex dignitário do Estado suspeito por ter cometido crimes durante o exercício de funções públicas, na minha opinião, deverá ser noticia e pelas piores razões.
O túnel do Marão vem trazer à região de Trás-os-Montes soluções de acessibilidade que até então não existiam. Bragança e Vila Real, só para enumerar as capitais de distrito, ficam indiscutivelmente mais perto do litoral, com tudo o que isto possa significar de oportunidades para o desenvolvimento da região e, consequentemente, para a criação de emprego e fixação de população.
Relativamente, à presença do Eng.º Sócrates na inauguração do túnel do Marão, a mesma não é só inusitada como é um atentado à democracia. A minha asserção não se prende com questões de culpabilidade. O senhor em questão tem as normas constitucionais para o efeito, que consagram as defesas e as garantias dos arguidos. A questão, porém, não é jurídica, e, muito menos judicial. A questão é eminentemente política, e deverá ser tratada neste campo.
Por conseguinte, o convite que o senhor Primeiro-ministro endereçou aos Senhores José Sócrates, Paulo Campos e Mário Lino, por razões diferentes, estes dois últimos por má gestão dos dinheiros públicos, para estarem presentes a inauguração do túnel do Marão, está eivado pelo desrespeito completo pelas instituições públicas. Sobretudo, é contrário à coisa pública, à ética republicana tão cara aos socialistas. Quem não perceber isto, que é o mínimo dos mínimos, poderá conduzir os desígnios do país? Penso que não deverá.
Mas o que mais me interpela, não foi o convite e a aceitação do mesmo. O que mais me importuna são os silêncios de muita “boa” gente sobre esta enormidade política. Alguém um dia afirmou; o que me incomoda não é o barulho dos maus, mas o silêncio dos bons.
José Policarpo (crónica na rádio diana)