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Acabou?

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Acabou! Acabou o mandato de Aníbal Cavaco Silva como Presidente da República. Foram dez anos em que a atitude e as escolhas políticas do titular do mais alto cargo da nação, apontaram sempre no mesmo sentido e em prejuízo dos mesmos.

Dez longos anos, que pareceram séculos, de uma forma de exercer o poder que se aproximou, na atitude conservadora e cinzenta, dos anos de chumbo da ditadura fascista que durou metade do nosso século vinte.
Discordo dos que dizem que Cavaco era uma figura fria e distante. Pergunte-se aos seus correligionários se alguma vez sentiram distância ou frieza, ou se lhes faltou a solidariedade da parte do anterior Presidente. Pergunte-se a figuras como Sousa Lara se não sentiram o conforto da atitude vingativa, no momento da condecoração que faria corar de vergonha qualquer um, que não o homem que nunca tem dúvidas e que raramente se engana.
Claro que foi frio e distante para os interesses da maioria, da mesma forma que foi próximo e caloroso na protecção dos interesses de classe que sempre defendeu, mas isso não é de estranhar. É a natureza da coisa.
Nos quarenta e dois anos de democracia, o anterior Presidente exerceu o poder durante vinte por vontade do povo com direito a voto. Disputou seis eleições e ganhou cinco.
Quando abandonou o cargo de primeiro-ministro, ao fim de dez anos, houve uma espécie de sensação de libertação e a imagem de Cavaco estava pelas ruas da amargura.
Volvidos dez anos, uma espécie de amnésia geral apoderou-se dos eleitores que olharam para a figura como alguém com a necessária sisudez para ocupar um cargo ainda mais elevado na hierarquia do Estado.
Sai, ao fim de mais dez anos, com os níveis mais baixos de popularidade atingidos por um Presidente da República e poucos serão os que não se sentem aliviados por se verem livres daquela forma de fazer política e, no entanto, escolheram uma versão sorridente e mais competente, do ponto de vista da comunicação, daquele que gostaram de se ver livres.
Alguém distraído poderá questionar-se que fatalidade é esta que leva a maioria a escolher o que parece odiar e a odiar o que parece escolher. 
Não é uma fatalidade e muito menos algo de estranho ou incompreensível. É, antes de mais, uma questão de condicionamento da escolha por quem tem os meios de influência para a criação de opinião numa maioria que, quando afirma que pensa pela sua cabeça está a pensar com a cabeça dos comentadores de serviço a aceitar de forma acrítica todas as certezas que lhe vão impingindo.
Há uma indústria que fabrica sabonetes e há uma indústria que os torna bem cheirosos para serem consumidos. Depois, quando o consumidor descobre que afinal não cheira assim tão bem, mudam-lhe a forma, trocam a embalagem e voltam à arte de convencer que aquele é que é o tal.
Quem controla as duas “indústrias” controla o acesso ao poder, criando as alternâncias necessárias para afastar as alternativas do exercício do poder.
Mas não pensemos mais nisso, porque hoje é dia de festa. Festejamos o primeiro dia sem o velho sabonete, ignorando que na embalagem do novo está a mesma marca do anterior. 
Até para a semana


Eduardo Luciano (crónica na radio diana)

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