Bem sei que muitos de nós queríamos mudanças políticas mais decisivas, mas não posso deixar de notar que alguma coisa mudou e que os tempos que vivemos abrem perspectivas de alguma esperança.
Se tudo correr dentro da normalidade, a Assembleia da República indicará para o Conselho de Estado um elemento de cada partido com assento parlamentar, com excepção do PEV e do PAN.
Dir-me-ão que a composição de um órgão consultivo do Presidente da República em nada influi nas decisões políticas que afectam o nosso dia-a-dia, mas em política o simbólico não deixa de ter um peso significativo no ambiente que se vive.
Como resultado deste novo ambiente, o Presidente da República volta a ter no seu órgão consultivo a presença de um membro indicado pelo PCP e o Bloco de Esquerda tem, pela primeira vez, um seu representante.
É verdade que tudo se continua a passar ao nível do simbólico, mas não deixa de ser importante que um lutador contra a ditadura, que pagou com o sacrifício da sua liberdade durante onze longos anos de cativeiro, integre um Conselho de Estado que terá a presença de um ex-ministro de Salazar.
Domingos Abrantes levará para este fórum não apenas a sua experiência de lutador contra a ditadura, mas também a sua perspectiva de classe.
Não deixa de ser interessante verificar as reacções de alguns comentadores que já tinham dado como certo que o PCP iria indicar o seu secretário-geral para a lista de candidatos apresentada pelo PS.
Atordoados com tantos desafios às suas certezas absolutas sobre o PCP, o seu funcionamento e a sua prática política, vão debitando asneiras e fazendo conjecturas em torno da indicação de Domingos Abrantes.
Deixem-se disso e festejem a entrada no Conselho de Estado de um homem que, com a sua luta e abnegada determinação, contribuiu para que todos os politólogos, encartados ou por encartar, possam dizer em liberdade o chorrilho de disparates com que nos moem o juízo todos os dias.
Até para a semana
Eduardo Luciano (crónica na rádio diana)