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Administração Regional de Saúde do Alentejo (explicação aos autóctones)

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©Joaquim Palminha Silva

    O dramático desfecho da falta de comparência, em tempo útil, da «viatura médica de emergência e reanimação» (VMER), adstrita ao Hospital do Espírito Santo/Évora (HESE), no dia 2 de Setembro (2014), originou a morte de um doente em paragem cardiorrespiratória.
            Entretanto, a Administração Regional de Saúde do Alentejo (ARSA) entendeu levar a cabo um «inquérito», para averiguar se houve «actuação digna de censura» ou até algum «ilícito de natureza disciplinar», que tenham motivado a inoperacionalidade da viatura e seus respectivos técnicos-tripulantes.
No passado dia 6 de Novembro o jornal diário local (Évora) transcrevia parte da “explicação” que a ARSA, um mês depois (!), enviou à agência noticiosa «Lusa». Assim, é publicamente comunicado que não houve nenhum «ilícito de natureza disciplinar» nem tão pouco «actuação digna de censura». Em poucas palavras, o resultado do inquérito da ARSA conclui que a lamentável falta de assistência médica a um doente, em tempo oportuno, no dia 2 de Setembro, ficou a dever-se ao facto de nesse mesmo dia a VMER ter estado inoperacional por falta de recursos humanos!       
Nem a índole do espaço («a cinco tons»), nem a proporção de uma crónica, nem as habilitações do cronista, fazem decerto esperar dos cidadãos leitores, nestas breves linhas, e tão breves quanto é possível, um estudo técnico da gestão praticada pela ARSA.
            1) Comecemos pelo princípio. Não é necessário ser muito inteligente para perceber que se determinado serviço médico de emergência sofre falta de recursos humanos e, portanto, está incapacitado para qualquer actuação eficaz de emergência, temos inelutavelmente de concluir que, para além da papelada administrativa, não existe no terreno da realidade material, e pronta a circular, VMER alguma;
            2) Contra a fatalidade “cruel da vida”, segundo declaração da ARSA a inoperacionalidade da VMER têm-se feito sentir «com alguma frequência», pelo que em 2013 a sua operacionalidade era de 77,25% e em meados de Setembro de 2014 já alcança os 96%. Enfim, nada nos impede de acreditar que o HESE, a ARSA, a própria tutela principal, o Ministério da Saúde, iniciam a sua prestação de serviços na área da saúde pública desta forma:
- Dia de inauguração do serviço, 0% de operacionalidade;
-Alguns meses depois, 25% de operacionalidade:
- Mais uns quantos meses, 50% de operacionalidade, e assim de seguida até chegar aos 100%, supomos…
            Quer isto dizer que os doentes necessitados com urgência de«reanimação» médica, antes “de se colocarem” numa situação de perigo de vida, devem indagar da percentagem de operacionalidade que tal ou tal mês “autoriza”, sob risco de não o fazendo, ao chamarem uma VMER, do Instituto Nacional de Emergência Médica (INEM), garantirem apenas o seu transporte num esquife…motorizado e com rodas de borracha (!);
3) Por fim, excluindo o Burkina Faso, devemos considerar singular (e de “grande imaginação” a nível europeu), esta forma de inaugurar serviços públicos às fatias percentuais de operacionalidade e, o que é mais pitoresco (informa-nos a própria ARSA), sem que o próprio Departamento de Urgência/Emergência do HESE tenha um director que assegure a orientação geral do serviço… Oxalá o dito «Departamento» não esteja a viver uma experiência de autogestão demasiado prolongada, dado que esta se revela… perigosa para os cidadãos!
O facto é que a ARSA realizou um «inquérito» exclusivamente direccionado para onde de antemão sabia nada haver a assinalar e, assim, concluiu o que tinha de concluir: nada de grave a assinalar, independentemente da morte, provavelmente escusada, de pessoas não assistidas pela VMER “atempadamente” (como gostam de dizer).
Todavia, apesar de alguma autonomia administrativa, a ARSA, não supervisiona o HESE? E o HESE não fiscaliza e orienta conscienciosamente o seu Departamento de Urgência/Emergência? – Face a este imbroglio, que faz o Ministério da Saúde? Encontra-se entretido com as poupanças nos Hospitais e Centros de Saúde e, nos intervalos, acorre às janelas a acenar o seu adeus entusiasta aos clínicos que emigram, continuando entretanto a destruição paulatina do Serviço Nacional de Saúde?!



Last but not least, a Entidade Reguladora da Saúde (ERS) descobriu que as unidades hospitalares do serviço público podem receber clientes privados! (in Público, 8/11/2014)
Naturalmente, avisa esta ERS, tal só poderá ser admitido após o Hospital preencher capacidades razoáveis de atendimento dos utentes do Serviço Nacional de Saúde… Pronto! - Está aberta mais uma porta para a desigualdade de tratamento entre quem tem e quem não tem dinheiro para pagar tratamento, operações, consultas, exames, etc.!  
Podem os donos desta geringonçaavisar que tomam medidas cautelares, de forma a não autorizarem concorrências e injustiças… Porém, uma vez aberta esta porta quem acredita?
Neste contexto de febril procura de clientes privados, eis mais uma “brilhante” orientação dos gestores do serviço de saúde pública de Évora: - A cardiologia do Hospital do Espírito Santo/Évora é apontada como de imediata disponibilidade…
Como é isto possível? - Não aumentou o número de médicos especialistas, nem de enfermeiros, nem de instalações, nem houve modernização/aquisição de equipamentos. Mais: - As consultas de rotina em cardiologia chegam a ter um ano de espera. Como vai acontecer: - Os hipotéticos e endinheirados clientes privados passam à frente dos utentes do SNS?
É-nos lícito, na apatia e na indiferença em que vivemos, querer instituições regionais de Estado democráticas, transparentes e sagazmente previdentes? Francamente, tenho sérias dúvidas. Porque a isso opõe-se o ”regime” tradicional das indiferenças e das contemporizações, em que vamos indo a escorregar com velocidade assustadora, no plano inclinado de uma geral decomposição cultural, cívica, social e económica.

Não devemos estranhar, portanto, as explicações aos autóctones. As instituições de Estado, regionais e locais, acreditando talvez que somos todos de compreensão lenta, quando pretendem fazer de conta que comunicam connosco, só lhes ocorre o recurso à lógica simplória e ao palavreado enfadonho das antigas autoridades coloniais em África. E assim nos vão escangalhando a saúde… e a Democracia!


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